Após uma das centenas de noites mal dormidas que fazem parte da vida de pai, iniciei o dia bastante cansado.
É direta a relação das energias do nosso corpo. Quando o corpo físico não está bem, é um prato cheio para a falta de autorregulação e inteligência emocional. Ficamos mais irritados, impacientes e menos empáticos. Isto também nos leva a sair do estado de presença, ter menos foco. Ficamos mais pessimistas, tudo parece estar errado.
Fui ao supermercado com Davi. Já no nosso andar, com as sacolinhas no chão do hall de entrada, abrimos a porta. Comecei a pegar as compras e colocar para dentro. Davi, claro, foi ajudar. Eu disse: “Filho, não pegue as sacolas com vidro, ok?”. Após alguns segundos, eu escuto um barulho forte.
Levantei a voz e disse: “Eu disse pra você não mexer na sacola de vidro. Olha o que você vez! Ainda podia ter se machucado!”.
Ele arregalou os olhos, assustado. Não disse nada. Peguei-o no colo e levei para longe dos cacos. Pedi para minha esposa ficar com ele.
Davi ainda quis tentar ajudar a limpar, e eu mais uma vez levantei a voz: “Eu falei pra você não vir aqui!” Tirei-o novamente da sala.
Não demorou para me arrepender. Porque eu havia sido o pai que não queria ser naquele momento?
Um tempo depois, organizei o jantar do Davi e sentei com ele. Enquanto ele comia, eu disse: “Filho, o papai gritou com você. Eu não queria ter feito isso. Me desculpe, vou tentar melhorar.”
E ele me disse: “Papai, quando você comprar algo de vidro, deixe a sacolinha aberta pra eu ver e saber que é vidro. A sacola que eu peguei estava fechada, eu não tinha visto o que tinha dentro”.
Desabei. Fiquei em silêncio. Ele não sabia…
Culpa do meu cansaço? Não. O cansaço físico é intrínseco de uma paternidade presente e ativa. Teremos centenas de dias neste estado por muito anos. O que não podemos ter é este tipo de reação todos os dias que estivermos cansados.
Meu dever é cuidar do meu estado interno todos os dias. E a partir disso, reverberar comportamentos coerentes ao pai que quero ser para os meus filhos. Isto está no meu controle.
Dormi mal? Posso tentar recuperar um pouco deste cansaço ao longo do dia.
Não consegui descansar o corpo? Preciso ser humilde, reconhecer e pedir ajuda. Sabendo do impacto do corpo físico nas emoções e na mente, não posso reagir em dias como este. Preciso respirar, dar um tempo. Agir depois de conseguir discernir o que houve. Preciso reconhecer meu estado interno e agir (ou não agir).
Você, pai, não precisa ser um super-homem, ficar sem dormir, trabalhar, resolver tudo e ainda manter o bom humor, serenidade, empatia e paciência. Isso é impossível, porque você é humano.
Podemos pedir ajuda para nossas parceiras, tirar o time de campo quando não estivermos bem. E muitas vezes o melhor que podemos fazer é “nada”.
Acorde, perceba-se, guie seu dia. Você é uma pessoa diferente a cada manhã. Você irá ecoar todos os dias seu estado interno. Cuide dele.
